4 de mar. de 2011

Casa pré-fabricada

Abre os teus armários, eu estou a te esperar
Para ver deitar o sol sobre os teus braços, castos
Cobre a culpa vã, até amanhã eu vou ficar
E fazer do teu sorriso um abrigo

Canta que é no canto que eu vou chegar
Canta o teu encanto que é pra me encantar
Canta para mim, qualquer coisa assim sobre você
Que explique a minha paz

Mais vale o meu pranto que esse canto em solidão
Nessa espera o mundo gira em linhas tortas
Abre essa janela, a primavera quer entrar
Pra fazer da nossa voz uma só nota

Sexta feira, véspera de festa, e acordei com a melodia que chama a primavera
Primavera igual a da minha folha azul sulfite, que ainda floriu pouco, coisa da qual não me arrependo
Contei as flores e lá haviam duas
Dois dias inteiros, a versar no singular
Dois concorrentes por vaga, foi o que me disseram ontem, na entrevista
Concorrer é palavra que não me cabe, a não ser que seja para correr junto, grudado, mesmo que distante e singular pareça
Correr pra alcançar a nota mais doce, mais suave, mais terna e eterna
Dois foram os dias de flores, que floriram forçadas no meu inverno azul bebê
E eu, que sou simbólica, gosto da casa construída aos poucos, pensada, sentida, pluralizada
Deixo entrar a todos, mas sempre de dois em dois, eu e mais um
Deixo entrar pela única porta aberta, enquanto as duas abas da janela repousam encostadas
Deixo entrar, visitar, eternizar o instante, mas por hora moro só
Moro no 1, acompanhada por dois longos zeros e instantes edificados
Moram aqui ambos numerais, e na minha simbologia, eternizado está um só
Um, que chama o outro, querendo encontrar o novo, de novo
Um, que se reconstrói ainda mais puro e leve, que se representa na menina e a ela representa
Um, que representa a espera solitária, sua angústia, medo, ânsia, vontade, saudade, vigor, amor; mas que não se adia
E se apresenta, tocando de leve as 1003 primaveras que entrarão pelas duas folhas abertas, azuis, sulfites, já-nelas.

Nenhum comentário: