24 de jan. de 2010

gira, gira, gira...

Meus 15 euros já se foram, junto com o gás que hoje não me deu comida nem banho quentes
O deserto já se foi também, junto com os camelos e os sares coloridos
Eu é que ainda aqui permaneço, comendo um Big Taste cujo gosto me lembra à guardanapo de papel, comido por engano junto com o sanduíche
O que talvez pudesse me consolar, no típico egoísmo humano, me desola ainda mais, i. e., um senhorzinho procurando, nos restos plásticos vermelhos e amarelos da mesa ao lado, algo com gosto de papel para comer
Minha divagação em torno do sunday de chocolate se esvai, assim como a pouca fome que ainda restava

Termino de comer o Big Waste, junto com os três sachês de Ketchup, que lembram algo parecido com tomate
Me lembro das notícias sobre a companhia de avião Low Cost com a qual costumo cruzar o céu - porém não desta vez, mais - a proposta de cobrança pelo uso do banheiro à bordo
Me lembro das lojas de 1,99 made in China, e penso nos olhinhos puxados que fabricaram a bolsa vermelha de 2 euros que comprei na semana passada, e que já teve o zíper quebrado
Lembro das minas de esmeralda de Minas e da história sobre as mortes  no seu último desabamento de terra
Lembro do olhar perdido dos moços de Dublin, com seus copinhos de moedas numa das mãos e suas guarrafas de sonhos bebíveis e cheiráveis, na outra
Lembro do quadro de 200 euros com casinhas coloridas e meninos negros felizes correndo por entre seus telhados, em oferta na feira da praça de Ipanema.
Lembro da propaganda do Hostel do Rio: Favela Tour e volto ao Marrocos que não irei ao lembrar dos 10% já pagos pelo Desert Tour
Penso que devo vagar a mesa e lembro-me de jogar os plásticos e papelões com um M amarelo, no lixo reciclável
E penso: bullshit...

3 comentários:

betucury disse...

Há muito tempo atrás, eu comia num trailler estacionado em frente a rodoviária. Tição Lanches (era famoso na época), lanche enorme. Um sujeito desce de seu carro prateado pede um lanche e não come nem a metade e joga no lixo com o saquinho plástico. Pela primeira vez vi alguém colocar a mão no lixo e puxar o resto. Tirei da mão do mendigo o saquinho, retornei-o ao latão e pedi mais um lanche pra ele. Isso acontece na ausência dos nossos olhos e na presença deles. Isso não diminui a nossa angústia, mas tbm não diminui o nosso poder de escrita. Vou por 2 pontos logo após aquela vírgula no chão. Um beijo

José Carlos Vilhena Mesquita disse...

Olá Michele
Não sabia que tinhas este blogue, que merece ser divulgado. Julgo que seria boa ideia enviares à Heloísa o endereço para que seja divulgado pelos colegas da turma.
Pelo que li tens muito jeito para a escrita criativa. Espero que continues a ler muitos e bons autores para melhorares as tuas capacidades inatas.
Não deves desperdiçar o teu talento, por isso te aconselho a escreveres todos os dias, para aprefeiçoares cada vez mais as tuas qualidades literárias.
Se puderes visita os meus blogs (Algarve História e Cultura; e Promontório da Memória).
Um abraço do teu velho professor Vilhena Mesquita

rafael disse...

essas lembranças são quase como um castigo: ao invés de libertar, prendem. mas há prisões preferíveis. essa é uma delas. saudade! :)