5 de jan. de 2011

Cartas

Era uma vez um jogo de tarô, de cartas decoradas a nanquim
Eram luas e sóis, letras e datas, fotografias cuidadosamente entranhadas na memória
O baralho era efêmero, mas se consolidava no reflexo, de uma retina na outra
Ao invés de dizer sobre o futuro, ele dizia sobre o instante, que nada tinha a ver com o tempo, em sua definição
Dizia sobre a instantânea ilusão de realidade, sem citações de Foucoult ou Arendt
Só citava o olhar
Só citava a si mesmo

A solidez era tanta, que o baralho construía jardins, paredes brancas, redes e até castelos
Mas tinha, na sua força, o espelho dos olhares...2
O castelo do tarô não era o de Calvino, nem o do Príncípe, pequenino
Era de homens e mulheres, meninos e meninas
Era de meninos grandes, e mulheres tão meninas
E era decorado por flores, e suas cartas rústicas, vagarosamente lapidadas pelo vento

A efemeridade também era tanta, por se tratar de instante, que um vento bem mais forte, talvez um vendaval, acabou por soprar as cartas, ao invés de lapidá-las
Os meninos e mulheres alocaram-se na sua realeza e se edificaram, sem a solidez do reflexo em 2
Sem o baralho de tarô

Alguns construíram novos castelos, outras deitaram-se nas redes ou se apoiaram nas paredes

Da efemeridade de uma única retina, o tarô ainda constrói os jardins
E eles têm uma única rosa, protegida pela cúpula de um príncipe menino e eterno

Um comentário:

betucury disse...

Cito células nas minhas retinas convexas, cito plasmas ...